domingo, 13 de outubro de 2013

Destino (continuação 3 do conto)



Quando a luz reapareceu, não foi vaidade ou luxúria que eu senti, mas sim amor ao reencontrar os teus olhos.
Nesse dia à noite, cujo escuro se perpetuava no horizonte, e cortejos de chuva surgiam imersos pelo vento abanando os candeeiros de rua cuja luz se fluía em bailados, reencontrei-te nesse programa de televisão que falava de gente da nossa terra que havia emigrado à procura dos seus sonhos.
Falava da esperança da viagem. Da procura do sentido para a vida. Sendo tu a própria viagem, em busca da tua essência, ao retornares ao teu interior, descobri-la na fonte do teu íntimo.
A música era o teu destino.
O Mundo a eterna melodia.
Que os pássaros cantam no céu quando migram em direcção ao azul, e cujo espaço se faz cor abrigando o seu globo.
Cuja partida era o propósito em serem felizes. Dividindo-se nessas duas paragens, apesar de sermos todos da mesma terra que é o mundo.
Por isso, apesar de longe, podemos estar tão perto, compreendendo que para tal é apenas necessário que nos abrace esse sentido da vida que só nós podemos sentir.
Tinhas partido muito cedo para a Índia, repleta dos teus sonhos. O principal era sentir-te realizada. A felicidade seria a sincronia com o que de elevado a tua alma ansiava. Sendo a tua eterna paixão a música, compunhas individualmente para à noite actuares em alguns bares da cidade. Durante o dia trabalhavas numa instituição de apoio social que prestava auxílio pelos bairros degradados da cidade. Face à desigualdade social, dizias que a maior retribuição era o sorriso daqueles a quem a vida sorria de forma mais humilde, e que face às adversidades da vida, não deixavam de acreditar num destino radioso.
Naquele momento, quando a luz retomou a nossa casa, e quando o escuro do céu parecia serenar a sua ameaça, os trovões insultaram em sua investida, declinando a terra da sua criação.
Sonhos roubados de nuvens cinzentas.
Sombras doentias que vivem da destruição.

            Foram os teus olhos que me apaixonaram. Olhos castanhos cujo brilho simbolizava o mistério, e cujas pestanas os decoravam em sua beleza, ao reflexo da alma suscitando o feitiço.
Foi a coincidência do reencontro após imensos séculos em que os nossos espíritos se haviam separado.
Assim dizia o meu íntimo.
Duas almas cujo amor é tão forte que do seu encontro se faz o mundo.
Da vida o permitir da forma pura, abraçariam todo o universo.
Dele se fariam histórias para todo o sempre, perpetuando-se no infinito tal como as grandes histórias de amor.
Desse abraço, e por tudo aquilo que significa, compreendi que o que importa é o quanto amas.
Mesmo que por vezes estejamos frios por fora em nossos traços distantes e solitários, mas pontos para nos entregarmos e nos tornarmos mais humanos.
Julgo que a vida nos torna frios para resistir ao ciclo que nos é interposto pela sociedade.
Mas Tu, nesses olhos que revelam imenso encanto e admiração pelo ser humano, pode entender que no mundo também existe quem se preocupe com os outros.
Existe sempre alguém que se preocupa connosco.

            A luz dos relâmpagos ao longe invadiam a casa e a chuva continuava a cair.
Das tuas palavras pude incutir algo de diferente.
Partilhando da mesma sensibilidade, de que é feita a alma do artista, que só ele sabe quantas chagas lhe suscitam a criação, na dor do seu plexo e na poesia da sua alma.
Fluindo nele a vida como raios de melodia que a tua voz pode admirar. Deixa-me criar para que possas brilhar.
Linda canção que brotou da tua alma, e em que depositavas os teus sonhos.
O teu sorriso iluminou a minha vida. Dele compreendi que ao sorrir para a vida ela retorna-nos como um espelho o que têm de melhor, mesmo que por vezes a encaremos com nevoeiro que nos cerca os sentidos. Sendo desse nevoeiro que é composta a nossa mágoa, que se torna amarga se dela não a exorcizarmos.

            São poucas as palavras que te podem descrever.
Tu a mais bela poesia.
Sendo o teu sorriso a mais bela melodia.
Todo o seu significado é em teus lábios a ternura e o amor, e nas palavras o gesto de apoio e da compaixão.
Faz-se alma em minha alma.
Depreende-se tal como uma folha ao vento, que nem a chuva consegue derrubar.
Eterna escolha do destino, que se migra dentro de nós, e no qual depositamos eternas esperanças.
Embora por vezes vagas e inconsequentes, mas da mesma forma que os sonhos que nos fazem caminhar.
Tornado de admiração simples. Chuva que se perpetua na senda do sublime, e para o qual o relâmpago é a luz do novo dia.
Num mundo em que o perdão se perde nas palavras e é agora um gesto sem valor.
Sombras na terra que trazem o seu significado ao mundo, e o conquistam pela sua escuridão. Forte é a luz que surge no destino radioso e nele a vida sorri em compaixão, quebrando esse nigredo.
Apaixonei-me por ti.
Os teus olhos são a procura do significado da vida.
O alcance do sonho, apesar das dificuldades, por que vá-le lutar.
Nunca é tarde de mais.
Nem no último suspiro.
O dia ao merecer o nosso sacrifício, por aquilo que achamos o correcto, se torna único e diferente por ele suscitar a justa causa.
Tu que te propuseste a ti mesma em ajudar os outros, na procura de um mundo melhor, que inspiras com as tuas palavras e a tua música.
O teu desejo em inspirar os outros a serem felizes.
Esse contágio pelo bem, criando uma corrente de inspiração infinita que se repercute pelo mundo. Evadindo-se das palavras para aqueles que te compreendem e te abraçam.
Na tua música e na tua generosidade pode entender que existia algo de especial.
No teu olhar pode encontrar esse brilho.
Apesar de todos sermos especiais, descobri a tua forma única e diferente, de qualquer outro sentido.
Só tu o compreendes.
Apenas tu captas o sentido das palavras. Admiração por ti.
Na tua humanidade sentis-te acolhida por esse povo que é a raiz da Índia pobre, cuja cultura se vinca na sua diversidade.
O estranho encanto que nós ocidentais ainda não compreendem.
Ao sorrires criou-se a minha alma.
O teu brilho reluziu a luz dos dias.
Vi a vida nascer da noite escura em que o céu se zumbia em focos de cor viva que relampejavam cortando o horizonte.
Cruzando o espaço infinito.
O mundo contou a sua história, da qual se fez as marés e a lua unirem nesse encanto.
Encanto que revejo em ti quando a lua reflecte a tua palavra.
Simples do eterno amor.
Compreendi depois que a chuva partiu, que no enlace do mundo, as nossas vidas se haviam reencontrado, embora tu nem eu nos apercebamos disso.
As nossas almas existiriam para além deste tempo.
Era esse o amor que nos ligaria pelo infinito.

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